Inventário

1.

E então surgiu a proposta de um inventário.

E parti em busca de um espaço sem limites ou parâmetros, uma caixa imaginária, vazia, em que passo a incluir elementos (e memórias) tais como “você!”, percursos, autoral, retrospecto, perspectivas, referências, questões, interesses, ressignificados.

2.

Ao que “resgatei” e subi um site. E junto, um blog. Parte da caixa.

3.

E nos meus pensamentos sobre o espaço não delimitado, duas figuras logo surgiram. Meus dois filhos e a diferença de dez anos entre eles.

Em relação ao primeiro, uma pequena digital para registrar seu crescimento, na medida em que eu não tinha o protagonismo das imagens, até então. E com essa, me vi em Tallinn, em agosto de 2007. Poeticamente, lá tudo começou.

Quanto à segunda, nasceu no dia em que me vi de frente com a fotografia autoral. Um outro momento, nesse sentido. Agosto de 2012. Ali tomou fôlego. Por circunstâncias naturais, apareci na semana seguinte.

Essas duas figuras se transformam em personagens, em muitas das minhas películas. E assumem meu entorno, meus interesses, buscas e desejos narrativos e de alguma construção por imagens.

4.

Tenho, sim, uma questão de projeção poética ao narrar a imagem que fiz naquela cidade, uma, uma que tenho na memória, ao final de uma viagem de trabalho a Helsinki, em que tomei um ferryboat numa manhã, não das mais frias, depois de uma noite intensa, e passei algumas horas na capital da Estônia. Não foi tão leve levantar o corpo de uma cama de hotel, quando o telefone tocou. Poucas horas. Mas não foi em vão.

E aí que falo dessa busca por um equilíbrio, por algumas descobertas. Hoje demanda muito mais. Mas também é bastante mais amplo.

5.

E, sim, uma outra personagem protagoniza. Volto a 2009. Ficção e realidades da vida que se misturam. E com ela, a personagem, exploro outras camadas, relações, descobertas, desejos. Elogio à cumplicidade, na busca pelo belo, no enredo de uma ou mais de suas vertentes.

6.

Toda essa cena se dá, hoje, no caminhar do processo analógico. Entra nesse meu tabuleiro de equilíbrio. De velocidade, demanda e quantidades já me chegam outros universos reais. Nesse jogo de buscas por algum entendimento é onde tenho meu encanto. Mas acima de tudo, vejo nesse processo vida e algo intensamente conectado com as catedrais que passam pela minha vida, e que, sem controle, vão para as imagens, edições, momentos. Aí estão os gritos. Assim tem sido e assim, tenho muito claro, por agora, é o que me interessa ser. Não há como desvincular os eventos da minha ficção (que pulsa e respira) do meu universo de criação, de poesia.

7.

Essas catedrais passam por elogios, dores, amores, tensões, rupturas, relações, corpo, escudo, crises, sensualidade, vida, sentimento, morte. Eterno. Eterno catálogo vital.

8.

Sigo aqui com uns elementos. Um personagem - que nem sei se é real! - com quem estive algumas vezes, num processo muito intenso e catártico (sempre), Leo Divendal (NE). Pela primeira vez em 2014 e então a cada dois anos, alguns dias juntos, sendo a última vez logo em janeiro deste ano. São residências muito intensas e que lidam muito mais com o processo, a maturidade, pesquisa e busca, do que propriamente os resultados. É um pilar, uma referência para meu trabalho, em que do imediatismo quero não pouca distância.

Personagem aquele, que me foi apresentado por outro, Marcelo Greco, que assume, de igual modo, um pilar aí nisso tudo. Nesse processo de orientação, que já leva alguns anos, me fez percorrer o olhar, a pesquisa, o interesse, a linguagem e as referências. Várias perspectivas. Generosidade única.

E a identificação nesse universo todo é incrível, pelo que dois outros nomes ainda surgem. Machiel Botman, com quem tive a incrível experiência de tomar umas taças de vinho e jantar, depois de uma visita ao seu atelier, perto de Amsterdam, em 2016. Além de colecionar seus livros e algumas fotos. Referência primeira para meu trabalho, sua busca, o entorno e a sua linguagem. E Michael Ackerman que, até aqui, somente conheço por meio de seus livros e um par de fotos na parede. Suas questões com a fotografia e seus trabalhos me conectam enormemente.

9.

E essa caixa inventário já não tão imaginária, que vai sendo ocupada e criada, na verdade, com esses elementos colocados em palavras logo acima, também acolhe:

Carbono (2014), 70x7 (2016), Call it True (2016), Fem Crossway (2017), River, carta p/ r. (2018), Next Monday Haven (2019).

E por ai: Caderno de Circunstâncias, Obsessões e Elogios (2020) e 1195 143 + Dance (2020), ainda não guardados.

10.

Volto.